segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Piquet: 25 anos do bi-campeonato!

Quinze de outubro de 1983. Num sábado, no circuito sul-africano de Kyalami, Alain Prost, Nelson Piquet e René Arnoux decidiriam o título do Mundial de Pilotos de Fórmula 1. Um dos três teria o privilégio de ser o primeiro piloto a ganhar um campeonato com um carro movido a motor turbocomprimido e a disputa prometia muito. Prost fora o dominador absoluto de grande parte da temporada, mas Piquet e Arnoux conquistaram vitórias e deram muito trabalho - especialmente o brasileiro, com uma reação fulminante nas corridas anteriores em Monza e Brands Hatch.

Pelo menos, o clima que existia na época era extremamente amistoso e Piquet e Prost chegaram a jantar juntos - algo impensável nos dias de hoje. O bate-papo sem dúvida serviu para amenizar as escaramuças de bastidores que a imprensa plantava entre Renault e Brabham, com os franceses acusando os alemães da BMW de utilizar combustíveis de foguete desenvolvidos pela Wintershall para seus motores - o que nunca foi provado.

Para a última corrida do ano, o grid tinha duas baixas: com a situação financeira precária, Teddy Yip retirou a Theodore Racing da temporada e não viajou para a África do Sul, deixando a pé o colombiano Roberto Guerrero e o venezuelano Johnny Cecotto. A Spirit também se ausentou com Stefan Johansson, mas por um motivo nobre: o motor Honda faria sua estréia na Williams com o novíssimo FW09 para Keke Rosberg e Jacques Laffite. Um batismo de fogo e tanto para os dois carros. E pela primeira vez no ano, todos os 26 inscritos largariam, inclusive a RAM March de Kenny Acheson.

Treinos

A guerra psicológica da classificação foi a princípio vencida por Nelson Piquet, embora o brasileiro não tivesse conseguido a pole position. Patrick Tambay, carta fora do baralho desde o GP da Europa, marcou o melhor tempo, virando em 1′06″554 contra 1′06″792 do piloto da Brabham. Riccardo Patrese, com um carro perfeito e muito rápido, conseguiu se infiltrar entre os rivais diretos de Nelson, ficando na frente de René Arnoux e Alain Prost no grid.

Keke Rosberg foi brilhante com o novo Williams Honda e fez o 6º tempo, mostrando não só que era um piloto rápido como também que o conjunto, com desenvolvimento, poderia ser muito competitivo. Um bálsamo e tanto para quem, do meio da temporada em diante, só classificou do décimo lugar pra trás. E com dezessete carros equipados com motores turbo ocupando os 17 primeiros lugares, o melhor dos “convencionais” foi Michele Alboreto, em décimo-oitavo. Na sua última corrida pela Ligier, Raul Boesel classificou-se em 23º, na frente de Kenny Acheson e dos dois Osella Alfa Romeo que fecharam a raia.

Corrida

Horas antes da corrida, num sábado, aconteceu o treino de aquecimento onde as equipes fizeram os últimos ajustes para a largada. Foi aí que a Brabham, numa cartada de mestre, definiu a estratégia suicida que mudaria a história da corrida. Ao contrário do que Renault e Ferrari imaginavam, Nelson Piquet é quem daria o bote, largando bem leve e disparando na ponta, enquanto Riccardo Patrese, a quem imaginavam que seria o “coelho” do brasileiro, faria o papel de fiel escudeiro. Um Sancho Pança a 300 km/h.

Disparado o sinal verde, autorizando a largada, Piquet arrancou feito uma flecha, para espanto de franceses e italianos. Patrese cumpriu à risca a tática e passou para segundo, deixando Tambay para trás. Andrea de Cesaris, totalmente alheio ao que acontecia na dianteira, largou muito bem e foi de nono para quarto. Alain Prost passou a primeira volta em quinto e René Arnoux, em sétimo.

Enquanto Tambay perdia posições para de Cesaris e Prost, outro piloto começava a dar show em Kyalami: Niki Lauda, décimo-segundo no grid, passou Cheever, de Angelis, Rosberg e Arnoux para chegar aos seis primeiros colocados. Na nona volta, o austríaco da McLaren também passou Tambay e veio para a quinta posição.

Correndo em oitavo, Arnoux foi o primeiro a cair na armadilha da Brabham. Enquanto Piquet corria solitário na ponta, o francês encostava nos boxes e abandonava a disputa. Agora, restavam o brasileiro e Alain Prost para discutir o título. E com o resultado da pista até aquele momento, Piquet era campeão.

Lauda, possuído como nos velhos tempos, seguia dando espetáculo. Na 12ª volta, ele passou a Alfa de Andrea de Cesaris e foi pra quarto, impondo uma enorme pressão a Alain Prost. Pouco depois, o francês perdia mais uma posição na corrida, deixando Piquet em situação ainda mais confortável na luta pelo título.

A situação permaneceu assim, com Piquet disparado em primeiro, Patrese de escudeiro e Lauda de coadjuvante de luxo, ocupando as três primeiras posições, até a 34ª volta, quando Lauda foi aos boxes para reabastecer e trocar pneus, voltando para a pista em sétimo. Logo depois, foi a vez do pit stop de Prost, e enquanto os mecânicos da Renault tratavam de efetuar o abastecimento, o francês já batera no cinto e abandonava a disputa: o motor não agüentou o esforço e quebrou.

Com o plano cumprido perfeitamente, a dobradinha da Brabham perdurou inclusive quando Piquet e Patrese foram aos boxes, sem sustos, para cumprir seus pit stops. Lauda continuava impossível e vinha em terceiro, na sua melhor exibição em 1983, trazendo de Cesaris, Tambay e Derek Warwick nas posições seguintes.

Na 56ª volta, o turbo da Ferrari de Patrick Tambay se entregou, ao mesmo tempo em que a Toleman de Bruno Giacomelli, em posição perigosa na pista, pegava fogo e os comissários, sem muita intimidade com os extintores de incêndio, despejaram uma nuvem de pó químico que chegou a atrapalhar a visão dos pilotos. Pouco depois, como prêmio pela tática perfeita de corrida, Nelson Piquet tirou o pé do acelerador e permitiu a ultrapassagem de Riccardo Patrese, o novo líder.

O brasileiro, só pra humilhar Prost e companhia limitada, reduziu a pressão do turbo nas últimas voltas e deixou também que seu velho amigo Niki Lauda o superasse para chegar ao 2º lugar. Só que, a cinco voltas do fim, o motor TAG Porsche Turbo deixou Lauda a pé - após um desempenho impressionante que era um “cartão de visitas” do que aconteceria na Fórmula 1 pelos anos seguintes.

De volta ao segundo lugar, Piquet poderia optar pela dobradinha, mas permitiu também a ultrapassagem de Andrea de Cesaris. Afinal de contas, os quatro pontos da 3ª colocação já bastavam para derrotar Alain Prost por dois pontos. E no fim da manhã daquele sábado, 15 de outubro, os fãs brasileiros de automobilismo entravam em delírio quando Piquet apontou na reta, depois da passagem do vencedor Patrese e de Andrea de Cesaris, para conquistar enfim o bicampeonato mundial e entrar para a história como o primeiro campeão mundial a bordo de um carro com motor turbo.

Assista ao vídeo da corrida: